O neto olhou o avô, como quem olha alguém de outro mundo.
Os olhos azuis do ancião eram de uma cor nitidamente celeste, como alguém que tem parentesco com algum estranho anjo.
Após ouvirem o estalar da fogueira, o chiar das salamandras quentes que rodopiavam um vozear de fogo vivo, o avô cortou o silêncio com estas palavras:

"As pessoas estão metidas dentro de uma gigantesca teia de aranha que é a sociedade de consumo. Esta sociedade foi montada em função da acumulação. As pessoas nem sequer estão conscientes disso. Quando compramos algo, não nos enganemos, estamos a comprar com o tempo de vida que gastamos para ganhar esse dinheiro. No fundo, o que estamos a gastar é o nosso tempo de vida! Quando te proponho a sobriedade como maneira de viver, mostrei-a para que tenhamos mais tempo, a maior quantidade de tempo possível, para viver a vida de acordo com as coisas que nos motivam, que não são necessariamente as coisas do trabalho…"

"Mas avô, as pessoas podem trabalhar para ter uma casa, uma carro melhor. As pessoas podem achar bem querer investir o seu tempo a ganhar dinheiro e com esse dinheiro comprar coisas melhores para elas."

"Sim, sim, que trabalhem…
E que trabalhem muito se quiserem, é uma decisão livre, mas somos livres quando não nos impõem uma cultura de COMPRAR E COMPRAR…
Porque a coisa mais importante que tu tens é o privilégio de estares vivo.
É um milagre que estejas vivo.
A felicidade não é algo de material…
Diziam antigamente que "um homem feliz não tem uma camisa", mas literalmente não é assim, essa é uma expressão poética e figurada…
A minha definição de pobreza é a mesma que diz Séneca:
"Pobres são aqueles que precisam de muito… Esses são pobres…"

E o fogo continuou a estalar noite dentro…



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